sexta-feira, 15 de dezembro de 2017

Transtornos psicológicos afastam professores da sala de aula.




A Educação, sob o ponto de vista individual e pessoal, é a formação e o aperfeiçoamento do ser humano. Sob o ponto de vista social, é a integração das novas gerações na sociedade, isto é, a transmissão às novas gerações, pelas gerações adultas, da herança social. Educar é formar a pessoa de acordo com um ideal de perfeição. Assim, consideremos como sendo a Educação o processo de edificação intelectual e afetiva, ou seja, a assimilação dos hábitos e valores que favorecem uma formação social que visam o Bem comum.
O Bem é tudo o que possui um valor moral ou físico positivo, constituindo o objeto ou o fim da ação humana. Para Aristóteles, o Bem é “aquilo a que todos os seres aspiram”; Também disse: “o Bem é desejável, quando ele interessa a um indivíduo isolado, mas seu caráter é mais belo e mais divino quando se aplica a um povo e a estados inteiros”.
Portanto, a Educação é a inserção social do jovem no mundo, dentro de alguns princípios fundamentais, para que seja capaz de viver e conviver com dignidade, cumprir as regras morais que foram culturalmente e tradicionalmente assimiladas pela sociedade e ser capaz de fazer reflexões éticas, inclusive sobre as próprias regras morais, através de sua capacidade de individualização. Além disso, o indivíduo deve ser capaz de se apropriar de certos conhecimentos, para criar as condições cognitivas e afetivas visando à sua autonomia, com o objetivo de acessar o mundo do trabalho e assim garantir sua própria subsistência.
Educação não é o mesmo que instrução. A Educação tem um sentido mais holístico, contempla a formação humana como um todo. Já a instrução é o ensino ou a capacitação para o exercício de funções específicas. Educação é dever do Estado e da família, mas principalmente da família.
No entanto, na configuração de mundo em voga, muitas famílias não possuem as condições materiais, intelectuais e afetivas para esse compromisso. Essas famílias são vítimas de um modelo histórico de exclusão social, que produziu a desigualdade em todos os sentidos,  daqueles que são submetidos à violência e à dominação vigentes e que jamais podem entrar em justas relações que fizessem reconstruir o sentido bom do poder.
Diante dessa realidade cruel, cabe ao Estado assumir a responsabilidade educativa. Essa responsabilização do Estado está na Escola e mais diretamente centrada na figura do Professor que tem que arcar com todo ônus da ineficiência de uma instituição destruída (a família), provocado pelo histórico descaso estatal e um modelo político e econômico excludente, selvagem e elitista.
Os professores de Escolas Públicas estão muito mais vulneráveis a esse tipo de problema, devido às suas características peculiares: a Escola Pública é plural, universalizada, composta por uma clientela bastante heterogênea quanto à condição econômica, social e cultural. Grande parte das crianças e adolescentes que estão matriculadas nas Escolas Públicas é oriunda de famílias que não estão devidamente preparadas para a função educativa. O resultado dessa realidade reflete na Escola e, mais especificamente, no trabalho do professor.
O desinteresse dos alunos pelos estudos, aumento dos casos de indisciplina, violência e atos infracionais nas escolas afetam drasticamente o lado psicológico dos educadores. Além disso, todos reclamam da remuneração e das condições de trabalho, principalmente a carga excessiva de trabalho e a indisciplina. Estas e outras são as principais causas de angústia e fobia que produzem problemas psicológicos graves, entre outras doenças que fazem com que o professor se afaste da sala de aula.
"O número de professores afastados por transtornos mentais ou comportamentais nas escolas estaduais de São Paulo quase dobrou em 2016 em relação a 2015: foi de 25.849 para 50.046. Segundo dados obtidos por um veículo de comunicação nacional,  por meio da lei de acesso à informação, até setembro de 2017, 27.082 professores se afastaram. O número de 50 mil afastados em 2016 representa 37% do total das licenças médicas pelas mais diversas causas." 
A principal causa de afastamento são transtornos mentais e comportamentais, responsáveis por 27,8% dos casos. 
Além das licenças de saúde, existem as faltas abonadas, justificadas, injustificadas e faltas médicas que engrossam o número de ausências do professor na sala de aula.
Os professores estão doentes tanto quanto está a Educação no Brasil dos mais humildes. Eles não conseguem desenvolver o seu trabalho plenamente, pois em uma sala de aula com 40 alunos, geralmente, apenas 10 deles (no máximo) têm algum tipo de interesse em estudar efetivamente. Os demais estão ali contra sua própria vontade e o resultado são os baixos rendimentos revelados nas avaliações em larga escala. O professor é injustamente responsabilizado pelos fracassos na aprendizagem.
Esse aluno também é vítima desse sistema perverso e mais vítima ainda é o professor que se expõe a situações desconfortáveis como, por exemplo, a humilhação, xingamentos, desrespeito. Está muito difícil corrigir um aluno que não traz consigo nenhum pré-requisito mínimo para a convivência social e o respeito pelos educadores.
Neste contexto, alguns sistemas de ensino preferem tomar medidas que atacam o efeito e não a causa, punindo os professores. No estado de São Paulo, supostamente com o objetivo de diminuir a quantidade de licenças saúde, o servidor ficará sem o pagamento até que a licença seja publicada no Diário Oficial, ou seja, as ausências no período compreendido entre o protocolo de licença e a decisão final devem ser consideradas como falta injustificada. O problema é que, após a perícia médica, o servidor deverá aguardar a publicação da mesma para receber o pagamento, caso a licença seja favorável.
Se existem bons e maus professores, também existem bons e maus governos, bons e maus representantes, bons e maus médicos... Ser professor é uma vocação, como deveria ser qualquer profissão, em sua base. Somente quem é professor sabe o quanto é difícil sê-lo nas condições sociais em voga, principalmente aqueles que trabalham em locais adversos, reféns da violência institucionalizada, sem as mínimas condições de segurança e de trabalho, tentando ensinar algo àqueles que não querem aprender nem o mínimo que está definido pelo sistema.
Ser professor se tornou uma escolha de poucos. Os baixos salários, a excessiva carga horária de trabalho, a desvalorização social e a falta de plano de carreira afastam as novas gerações da profissão. As salas de aulas superlotadas dificultam o trabalho. O profissional da educação básica cumpre com muitas atividades fora da sala de aula: tem que ler, estudar, manter-se informado, preparar boas aulas, corrigir provas e atividades. Então, uma carga horária de 40 horas semanais, de fato, torna-se até 60 horas com as atividades realizadas fora da sala de aula.
O professor está doente pelo mal-estar provocado pelo sentimento de opressão, seja de inquietude relativa a um futuro incerto, ao medo de ser a qualquer momento agredido e pelas incertezas de um presente ambíguo. É dominado pela inquietude, pela ansiedade, pela agitação, pelas fobias e por um sentimento confuso de impotência diante de suas limitações e um perigo eventual. Por isso, o Estado precisa repensar a suas políticas públicas, valorizar e apoiar mais um profissional tão importante para o futuro do país. Uma sociedade não é um mero conjunto de indivíduos vivendo juntos, em um determinado lugar, mas define-se essencialmente pela existência de uma organização, de pessoas que cumprem os seus deveres, se respeitam mutuamente, são capazes de ganhar sua própria subsistência com dignidade, que têm valores morais e uma atitude ética acima de tudo. E esses valores são construídos junto com o Professor.

(Fontes: Portal G1. 21/11/2017. Tese de Mestrado defendida por Ielva Bentes Galdino pela Universidade Federal de Juiz de Fora.)



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